Quando empreendemos a pesquisa a respeito do surgimento do hospital, nos deparamos com a questão de sua arquitetura pontuando a preocupação com a administração de cuidados, aos que necessitam de assistência, desde os mais remotos tempos da História. A partir do artigo de Antunes (1989), que preconiza o surgimento da “geografia hospitalar” como uma nova disciplina, observamos a preocupação com a implantação e a formatação destes espaços, no sentido de proporcionar adequada ambientação para as atividades desenvolvidas na prestação de cuidados à saúde.
“Muito antes que a medicina, a arquitetura foi a primeira arte a ocupar-se do hospital. A idéia de que o doente necessita de cuidados e abrigo é anterior à possibilidade de lhe dispensar tratamento médico.(...) Templos, conventos e mosteiros foram as primeiras instituições a recolher doentes e providenciar-lhes atenções especiais, como no culto a Asclépio na Grécia Antiga.” (Antunes, 1989, p. 227/228).
O desafio da arquitetura hospitalar de hoje é o de dotar estes espaços de conotações de acolhimento e familiaridade para o usuário, dotando a prática médica de um sentido de segurança e confiabilidade ao paciente, visando seu rápido restabelecimento e a minimização do seu sofrimento, finalidade primeira da instituição.
A HUMANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS DE ATENÇÃO À SAÚDE
Uma nova experiência na implantação de hospitais pode ser observada a partir da criação da PLANETREE, uma organização sem fins lucrativos, criada na Califórnia, USA, em 1978, por uma paciente insatisfeita com o tratamento pouco humanizado e traumatizante a que foi submetida, durante a sua internação. Estes conceitos fazem parte, ainda, da crescente tendência de assistência à saúde que combina amenidades e suporte emocional eficiente ao lado de cuidados médicos de qualidade, que é o chamado Patient-Centered Care.
A princípio, estes novos conceitos, podem ser considerados apenas como um incremento na qualidade do atendimento à saúde, o que efetivamente se procura, nestes tempos de qualidade total. No entanto, mais do que isso, existem estudos quantitativos e tabulações que nos levam a enfatizar a concepção de ambientes mais humanizados e dotados de itens de conforto ambiental, para apressar a cura e a alta de pacientes em unidades de saúde.
A partir destes novos conceitos podemos dizer que um novo modelo de hospital está surgindo. Estes parâmetros são baseados na forte corrente da humanização que permeia os estudos e pesquisas sobre a arquitetura de instituições de saúde. O desenho do novo hospital está, acima de todas as outras determinantes, baseado solidamente na figura do paciente e na tradução de todos os seus direitos e aspirações enquanto usuário do sistema de saúde.
Jain Malkin preconiza um desenho de hospitais baseado em evidências (evidence-based design), assim como a medicina baseada em evidências (evidencebased medicine), apresentando alguns requisitos (MALKIN, 2003), que ela descreve da seguinte maneira:
• eliminar os fatores ambientais estressantes como ruído, falta de privacidade, iluminação excessivamente forte, baixa qualidade do ar interior;
• conectar o paciente com a natureza através de janelas panorâmicas para o exterior, jardins internos, aquários, elementos arquitetônicos com água etc;
• oferecer opções e escolhas para o controle individual incluindo privacidade versus ambiente social, controle da intensidade da luz, escolha do tipo de música no ambiente, opções de posições no sentar, silêncio e quietude versus áreas de espera “ativas”;
• disponibilizar oportunidades de socialização através de arranjos convenientes de assentos que promovam privacidade aos encontros de grupos de familiares, acomodações para a família e acompanhantes nos ambientes de internação e para pernoite nos quartos;
• promover atividades de entretenimento “positivas” como arte interativa, aquários, conexão com a Internet, música ambiente, acessibilidade a videos especiais com programas que possuam imagens e sons reconfortantes e adequados à assistência à saúde;
• promover ambientes que remetam a sentimentos de paz, esperança, reflexão, conexão espiritual, relaxamento, humor e bem estar.
O HOSPITAL DO FUTURO
Os projetos arquitetônicos do hospital do futuro implementam, com o desenho e a concepção dos seus ambientes, a agilidade no processo de cura, a facilitação da incorporação tecnológica e a presença do conforto ambiental, estabelecendo espaços que integram o paciente com a natureza e que embasam a nova abordagem de assistência à saúde, centrada no paciente como um todo e na integração do seu bem estar físico, psicológico e espiritual. As bases dos conceitos apresentados podem ser consolidadas em seis recomendações, orientando a implantação e conformando uma nova abordagem para o desenho de hospitais. São elas:
• ACOLHER o paciente, dotando os ambientes de acesso à unidade- as “portas de entrada”- de aspectos de conforto, ampla oferta de informações, sinalização conveniente, facilitação de fluxos, salas de espera acolhedoras, facilidades como comunicação telefônica, cantina, atendimento pelo Serviço Social, áreas especiais para crianças e agilidade nos acessos à ocorrências de gravidade acentuada ou alta complexidade.
• INFORMATIZAR os estabelecimentos, agregando ao projeto todas as premissas para um grande conforto na distribuição de rede lógica, que possa ser dimensionada e flexibilizada o suficiente para atingir pontos disseminados por todos os setores, com ênfase nos acessos de Emergência e Urgência, Postos de Enfermagem, Salas de Telemedicina, Centros Cirúrgicos, Serviços de Imagem e laboratoriais, prevendo, ainda a sua futura expansão.
• PROMOVER a saúde da população através da integração dos mais diversos programas de prevenção e promoção de saúde, destinando áreas e espaços adequados para a educação de saúde e o desenvolvimento de ações de treinamento, convivência, didática e qualificação de médicos, enfermeiros, atendentes e usuários, na direção da implementação das idéias do movimento das Cidades Saudáveis.
• FLEXIBILIZAR a concepção da estrutura física da unidade, dotando seu desenho de atributos arquitetônicos para a sua futura ampliação, incorporação de tecnologia, reformas e readequações, através de modulação do desenho, racionalização de circulações, setorização adequada de serviços, análise criteriosa do programa arquitetônico e estabelecimento correto do perfil da unidade.
• HUMANIZAR os ambientes, incorporando itens de conforto ambiental que sejam capazes de afastar os fatores estressantes inerentes aos espaços hospitalares, e tendo como principal foco de atenção e de cuidados projetuais os desejos, aspirações e necessidades do paciente e a sua total integração com a natureza, o respeito à sua individualidade e a visão de conjunto de sua saúde física, psicológica, social e espiritual.
• COMPATIBILIZAR tecnologia, conforto ambiental e agilidade de fluxos com uma criteriosa escolha na especificação de materiais e de acabamentos, sistemas construtivos, modulações, durabilidade, segurança e facilidades na sua manutenção, agregando conceitos de prevenção e controle da infecção hospitalar e de biossegurança, dotando os estabelecimentos de potencial para atingir muitos anos de uso, com ambientes satisfatórios, eficientes e sólidos.
A partir da disseminação e do uso dos conceitos apresentados, poderemos contar com ambientes de atenção à saúde construídos com o olhar voltado para o futuro e ara o atendimento integral dos agravos da população, colocando o indivíduo no centro das atenções projetuais, e redimensionando os espaços para a sua verdadeira e oncreta missão, de prestar conforto para os males e a promoção da saúde dos indivíduos.
ELZA MARIA ALVES COSTEIRA
MSc- PROARQ-FAU-UFRJ.
Créditos: Flex Editora
- Publicação: Hospitalar
- Edição: 1
- Dezembro de 2006
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