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terça-feira, 22 de novembro de 2011

Um balanço da década de 2000 - Transportes

Terminal da Lapa, São Paulo, Núcleo Arquitetura
Terminal da Lapa, São Paulo, Núcleo Arquitetura
 
Arquitetura foi refém da falta de investimento em transportes
Em 2000, o metrô paulistano tinha quase 50 quilômetros de linhas e transportava em média 2,3 milhões de passageiros por dia, de acordo com dados da Fundação Seade. As linhas cresceram, em uma década, 26% e hoje somam pouco mais de 62 quilômetros, enquanto o número de passageiros por dia passou para 3,5 milhões, aumento de quase 52%, segundo dados da Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos.

Havia demanda, mas não houve construção. Esse é um dos vários exemplos, nos anos 2000, em que a arquitetura ficou refém da falta de recursos destinados ao transporte público. No caso do metrô, depois que foi colocada em operação, na primeira metade da década passada, a linha 5 - Lilás, com estações desenhadas por Luiz Carlos Esteves, nenhuma outra via começou a operar.
Foram inauguradas estações que prolongaram a já existente linha 2 - Verde, como as projetadas por Ilvio Silva Artioli. Conturbada também é a história do Expressso Tiradentes, na capital paulista, vítima de mudanças nas prioridades administrativas da prefeitura. Chamado inicialmente de Fura-Fila e depois de Paulistão, ele teve seu primeiro trecho inaugurado depois de dez anos e três administrações municipais.

Em sua linha, destaca-se a arquitetura dos terminais Sacomã e Parque D. Pedro, projetados por Ruy Ohtake. Porém, como parte do trajeto é feita por via elevada, não foi possível evitar as interferências visuais negativas que criou na cidade.

Uma das intervenções de maior impacto na capital paulista, na década passada, foi a implantação dos corredores de ônibus (pistas por onde trafega quase exclusivamente esse tipo de veículo), que temporariamente conseguiram afastar o fantasma do colapso no transporte urbano.

Do ponto de vista urbanístico, um dos mais bem resolvidos é o da avenida 9 de Julho, cujas estações de parada, desenhadas por Barbosa e Corbucci Arquitetos, caracterizam-se pelo vermelho intenso dos pórticos metálicos paralelos.

O corredor que liga o centro à zona oeste tem no terminal de ônibus da Lapa, projeto do Núcleo Arquitetura, um legítimo herdeiro da qualidade arquitetônica dos terminais Parque D. Pedro, desenhado por Paulo Mendes da Rocha, e Princesa Isabel, de João Walter Toscano. Na mesma fonte foram beber os integrantes do escritório Una Arquitetos, que projetaram o terminal de Pirituba.

A cidade mineira de Uberlândia também apostou nos corredores de ônibus para a fluência do trânsito, com resultados interessantes na proposta elaborada pelo estúdio Modo Arquitetura.

No transporte aéreo, outros dados impressionam: em 2009 passaram por Guarulhos, o principal aeroporto do país, aproximadamente 21,6 milhões de passageiros, enquanto em 2003 eles eram 11,6 milhões. Nesses seis anos em que a demanda quase dobrou, não houve nenhuma obra de ampliação.

Um rápido rasante sobre a arquitetura de aeroportos mostra que a intervenção nesses complexos foi escassa. Ainda assim, são expressivos os projetos dos novos terminais de passageiros do Aeroporto Internacional Zumbi do Palmares, em Maceió, criado pelo arquiteto Mário Aloísio Melo, e do Aeroporto Internacional do Recife/ Guararapes, projeto de Ubirajara Moretti.

A mobilidade urbana é um dos desafios que o país terá que superar, já na década atual, para sediar com garbo as duas principais competições esportivas mundiais: a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Fica, de antemão, uma pauta para a próxima retrospectiva.

Terminal Sacomã do Expresso Tiradentes, São Paulo, Ruy Ohtake
Terminal Sacomã do Expresso Tiradentes, São Paulo, Ruy Ohtake
 
Estação de metrô Santo Amaro (linha 5 - Lilás), São Paulo, Luiz Carlos Esteves
Estação de metrô Santo Amaro (linha 5 - Lilás), São Paulo, Luiz Carlos Esteves
 
Estação de metrô Alto do Ipiranga (linha 2 - Verde), São Paulo, Ilvio Silva Artioli
Estação de metrô Alto do Ipiranga (linha 2 - Verde), São Paulo, Ilvio Silva Artioli
 
Terminal de passageiros do Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, Maceió, Mário Aloísio Melo
Terminal de passageiros do Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, Maceió, Mário Aloísio Melo
 
Terminal de Pirituba, São Paulo, Una Arquitetos
Terminal de Pirituba, São Paulo, Una Arquitetos
 
Corredor de ônibus em Uberlândia, MG, Modo Arquitetura 
Corredor de ônibus em Uberlândia, MG, Modo Arquitetura
 
Arquitetura do chão
Corredor de ônibus 9 de Julho-Santo Amaro (2003/04) Roberto Mac Fadden e Pedro Esteban Folegotto
Por Renato Anelli
Os projetos de infraestrutura de transportes são usualmente agressivos ao meio no qual são implantados. O projeto de reestruturação viária do corredor de ônibus 9 de Julho-Santo Amaro, em São Paulo, demonstra que é possível fazer de outro modo.

Trata-se de uma
arquitetura do chão, raramente valorizada na nossa cultura, mas essencial para dotar nossas cidades de urbanidade. Saíram as imundas barreiras de tipo “new-jersey” e entraram o pavimento de concreto, os pisos elevados para embarque, os cabeamentos subterrâneos, a iluminação especial, as travessias de pedestres. Calçada, mobiliário e infraestrutura definidos e implantados pelo poder público.

Duas mudanças de tecnologia
nos transportes, envolvidas neste projeto, possibilitaram um impacto urbanístico positivo.

A primeira foi a integração através de
bilhetes eletrônicos, que tornou dispensável os velhos terminais do tipo curral, onde só entra quem passou pela catraca depois de adquirir sua passagem. O sistema digital permite a difusão da integração ao longo das linhas, facilitando o planejamento de redes nas quais as linhas-tronco são alimentadas por linhas locais. O atendimento do serviço de transportes se torna mais capilar e os equipamentos mais difusos pela cidade, permitindo que infraestrutura seja discreta na paisagem.
A segunda foi a transformação de toda a frota de ônibus em veículos com portas dos dois lados, proporcionando o acesso tanto pela direita, nas calçadas dos bairros, como pela esquerda, no canteiro central dos corredores. Um dos problemas de corredores urbanos desse tipo implantados a partir da década de 1980 era que os veículos com acesso apenas pela direita exigiam um traçado sinuoso, único modo de encaixar as áreas de embarque/desembarque no exíguo espaço viário. Com os embarques centrais possibilitados pela nova frota, o traçado se tornou mais linear, organizando de forma clara os equipamentos no centro da via.

A combinação de ambas as tecnologias está presente em várias intervenções na cidade de
São Paulo a partir de 2003, sendo os trechos implantados nas avenidas 9 de Julho e Santo Amaro (apenas uma parte do projeto inicial de 15 quilômetros) os que apresentam o melhor resultado na sua relação com o meio urbano.

O projeto insere-se na tradição das
vias públicas paulistanas da primeira metade do século 20, quando se pensava, a um só tempo, da escala do território à do pedestre. Apresenta, no entanto, a vantagem de participar do esforço contemporâneo de priorização do transporte público e não do transporte individual por automóvel. Demonstra que a infraestrutura pode e deve ser pensada como arquitetura da cidade.

Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 371 Janeiro de 2011
 
 
 
 

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